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Produzida e publicada pela Mafra Editions, editora com sede em Joinville/SC, 'Por Amor e Fé, Os Dias Em Auschwitz' é uma obra clássica de ficção histórica que já emocionou milhares de leitores nas plataformas digitais e agora está disponível gratuitamente para a alegria de todos que apreciam o gênero. Este é o nosso presente pra você. Boa leitura!Mia vivia uma vida feliz e normal com sua família e seu namorado na Alemanha dos anos 30. Fiel às suas crenças, propagava os ensinamentos de sua religião com prazer e devoção. Até que a chegada de Hitler ao poder pôs em xeque toda a sua vida e a vida dos membros de sua família. Ameaçada por uma propagação nazista cada vez mais explícita, Mia via seus templos serem destruídos e sua religião ser perseguida cada vez mais. Proibida de demonstrar atos públicos de fé, ela, a família e o namorado começam então a exercer sua religião de forma velada. No entanto, a estratégia não funciona por muito tempo. Mia então vê uma série de acontecimentos inesperados e dilacerantes tomar conta de sua vida. Terá que lidar com a morte, com a solidão, com a perseguição e a tristeza assoladora de uma alma angustiada. Sua fé será capaz de mantê-la de cabeça erguida diante de tantas atrocidades cometidas pelo regime nazista e pela constante ameaça do pior, que parece cada vez mais perto?
Capítulo 01
Primavera
São doces as lembranças daquela primavera, quando costumávamos brincar todas as tardes no jardim de flores coloridas. Havia ainda algumas árvores com maçãs e outras frutas. Tínhamos uma pequena horta com batatas e alguns vegetais. Mamãe era uma mulher dedicada ao lar e à família, além de servir com fervor na obra missionária. Éramos uma família feliz e fiel às nossas crenças. A Alemanha era o nosso país. Vivíamos na cidade de Colônia, no interior, lugar onde vivi bons e maus momentos.
Dançar com as minhas irmãs era um dos meus passatempos favoritos. Me recordo como se fosse ontem quando pegamos algumas flores e fizemos coroas para colocar nos cabelos. Era costume, sempre depois da brincadeira, levar os gansos até o rio que ficava próximo à minha casa. Eles nadavam, e eu e minhas irmãs nadávamos também, nos divertíamos de verdade. Aqueles foram dias memoráveis.
A casa da minha família era conhecida como a “idade de ouro”, isso porque em sua fachada havia um grande letreiro escrito em letras douradas que anunciava a “Sentinela”, revista publicada por nós, Testemunhas de Jeová.
Eu e meus irmãos fomos muito amados por nossos pais. Me sentia feliz em um lar cristão. Sempre estudamos a Bíblia juntos, e aprendemos piano e violino, o instrumento musical preferido do meu pai. Foram ensinamentos que impactariam de modo significativo a minha vida ante os acontecimentos que estariam por vir.
Capítulo 02
Amor
De todas as memórias, os dias mais lindos foram ao lado do meu primeiro namorado e noivo Vagner. Estávamos sempre juntos compartilhando nossas crenças e ideais. Defendemos nosso amor e a nossa fé independentemente do que precisamos enfrentar.
O Vagner também gostava muito de tocar piano. Admirávamos a música clássica. Meus compositores favoritos eram Ludwig van Beethoven e Johann Sebastian Bach. Passamos tardes tocando, algumas vezes até arriscando composições. A música é mesmo uma arte inspiradora e tem o poder de fortalecer as boas lembranças e o amor que existe em nosso coração.
***
Tivemos um pouco de paz até as coisas piorarem, e as coisas pioraram mesmo a partir do ano de 1939, logo após o início da Segunda Guerra Mundial. Naquele dia, meu irmão mais novo, Charles, chegou machucado da escola. Foi difícil compreender por que aquilo estava acontecendo.
Nunca me esqueço do meu quarto que ficava no sótão da casa. Era o meu refúgio, o lugar onde me perguntei tantas vezes porque os seres humanos eram maus assim. Depois que Adolf Hitler se tornou presidente, tudo havia mudado para sempre. Aos poucos, perdíamos nossa liberdade de culto e de crença. As Testemunhas de Jeová eram um grupo pequeno na Alemanha, mas ainda assim significativo.
— Mia, Mia! – meu irmãozinho Charles entrou em casa correndo, chamando por mim, com tom de voz amedrontado.
— Charles, o que aconteceu? Você está todo machucado! Quem fez isso com você? – perguntei assustada, sentindo piedade do meu pobre irmãozinho.
— Eles me bateram! Eles me bateram! – Chorou desesperado.
Todos os dias, quando as crianças iam para a escola, tínhamos que pensar o que teríamos que enfrentar naqueles momentos de angústia. Éramos fortes, mas a dor muito real. Como não fazíamos saudações à bandeira do país nem dizíamos “Heil Hitler”, agindo diferentemente das outras pessoas, sofremos as consequências. Sofremos agressões físicas. Por esse motivo o pequeno Charles havia sido agredido na escola: ele não havia feito a saudação a Hitler. De imediato, chorei muito ao ver meu irmãozinho padecendo daquela maneira tão cruel e estúpida.
— Mia, o professor parecia um demônio. Ele me disse gritando que eu deveria fazer a saudação a Hitler, repetiu várias vezes “Heil Hitler” e me bateu, me bateu muito. Não quero mais ir à escola – Charles me disse enquanto me abraçava.
Há pouco eu havia completado dezoito anos, já havia terminado meus estudos. Por pouco não tive que enfrentar essa situação dentro da sala de aula por mais tempo. Minha estratégia era sempre chegar atrasada, depois da saudação. Nunca dissemos “Heil Hitler”, porque isso significa “a salvação vem de Hitler”, e nós acreditamos que a salvação vem por meio de Jesus Cristo.
***
Diante de todas as minhas crenças e de todos os fatos corridos na época, eu tinha certeza de que o mundo estava sob a influência e domínio do mal. Eu estava lá, eu vi quando as sinagogas foram incendiadas, presenciei a triste cena de milhares de livros sendo queimados apenas pelo fato de terem sido escritos por judeus ou por pessoas contrárias aos ideais do Partido Nazista.
Os alemães pareciam cegos, completamente hipnotizados por uma ideologia injusta e que certamente levaria a humanidade ao caos e à destruição.
Aquele era o começo do que na verdade sempre existiu no coração dos seres humanos: o desejo incontrolável de ser superior, de ser o melhor, de estar acima de tudo e de todos, de ter o poder nas mãos.
Capítulo 03
O Início
Eu preciso dizer como tudo começou. Impossível esquecer aquele ano em que Adolf Hitler tornou-se o Chanceler da Alemanha. A partir de então, as políticas raciais do partido nazista começaram a ser implantadas em todo o país.
Eu ainda era uma adolescente imatura, mas já podia entender que tudo aquilo não terminaria bem. A ideologia hitlerista de intolerância lançou uma campanha com a intenção de destruir as Testemunhas de Jeová. Um ano depois de Adolf se tornar presidente do país, ele proibiu em toda nação ariana as práticas religiosas e pregações de nós, Testemunhas. Meu coração se entristeceu por saber que a minha fé era proibida.
Ainda que minha crença não houvesse sido proibida, eu jamais faria o sinal de saudação a Hitler, e isso porque dentro do meu coração sempre tive a certeza de que o único salvador do mundo sempre foi e sempre será Jesus Cristo. Acredito que esse fato por si só já levaria as Testemunhas de Jeová a serem banidas e perseguidas. Nunca juramos nem jamais juraremos fidelidade a governos corrompidos pelo mal que impera neste mundo.
Minha alma se feriu ao ouvir um dos primeiros discursos de Hitler sobre a proibição do exercício da fé das Testemunhas de Jeová. Ele disse:
“Esses chamados Fervorosos Estudantes da Bíblia são perturbadores. Considero-os charlatães, não os tolerarei, por suas arrogantes denúncias aos católicos alemães e ao estado de direito. Por isso os dissolvo para sempre da Alemanha.”
Embora eu ainda fosse uma recém-adolescente, o discurso daquele homem impactou minha alma. Senti naquele instante que nada mais seria o mesmo. O Chanceler afirmou que seria feita uma desintoxicação moral e política. Em outras palavras, uma limpeza na arte e manifestações culturais e religiosas. Adolf deixou bem claro que os interesses de seu governo estavam acima de tudo e de todos. O rádio estava ligado. Essas foram algumas das palavras dele:
“O governo da revolução nacional vê fundamentalmente como sua obrigação, de acordo com o sentido da confiança dada pelo voto popular, manter longe da formação da vida da nação aqueles elementos de que consciente e intencionalmente negam esta vida. A igualdade teórica diante da lei não pode resultar na tolerância sob igualdade daqueles que fundamentalmente escarnecem a lei... Simultaneamente com essa política de purificação de nossa vida pública, o governo do Reich procederá um inteiro expurgo moral do corpo da nação. Todo sistema educacional, o teatro, o cinema, a literatura, a imprensa e o rádio – tudo será empregado como um meio para este fim e dessa forma avaliado. Todos estes elementos devem servir para a manutenção dos valores eternos presentes no caráter essencial de nosso povo...”
A palavra purificação não me transmitia paz, pois, ao se dizer que é preciso purificar algo, entende-se que existem impurezas a serem eliminadas. Nesse caso, as impurezas eram tudo aquilo que desagradasse o governo de Hitler. Ele prosseguia:
“A arte sempre ficará sendo a expressão e o reflexo dos anseios e da realidade de uma época. Atitude neutral e internacional do alheamento está desaparecendo rapidamente. O heroísmo avança apaixonadamente e no futuro moldará e norteará o destino político. A tarefa da arte é ser a expressão desse espírito determinante da época. Sangue e raça serão mais uma vez a fonte da intuição artística. É tarefa do governo providenciar que justamente num período de poder político limitado, os valores vitais internos e a vontade de vida da nação encontrem uma gigantesca expressão cultural. A obrigatoriedade diante desta decisão é expressão de reconhecimento aos personagens de nosso grande passado. Em todas as áreas de nossa vida histórica e cultural, deve ser erigida esta ponte entre passado e futuro. O respeito diante dos grandes homens deve ser ensinado novamente aos jovens como herança sagrada. À medida que o governo está decidido a proceder com a desintoxicação política e moral de nossa vida pública, ele consegue e assegura as condições para uma verdadeira e profunda vida religiosa.”
Um ser humano que pregava o ódio e a morte de pessoas inocentes não poderia querer nenhuma manifestação religiosa que certamente iria contra suas ideologias.
Jamila Mafra & Mafra Editons